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07 agosto, 2011

Duas opiniões diferentes? - Professores em Rede


“Nem tanto ao mar, nem tanto a terra”


* Interessante estes posicionamentos veiculados no blog.educarede

Em 07-08-2011 08:40, Ivanildo Ximenes escreveu:
ENTREVISTA - JOSÉ MORAIS
Aluno tem que fazer ditado
Um dos graves problema da educação brasileira é a incapacidade de alfabetizar as crianças nos primeiros anos de escola.
A última Prova Brasil mostra que 40% dos alunos do 5º ano não conseguem ler e que cerca de 70% não entendem o que lê.
Professor da Universidade Livre de Bruxelas, na Bélgica, e doutor honoris causa pela Universidade de Lisboa, o português José Morais defende a volta dos ditados, o treino da caligrafia e a ênfase na escrita cursiva como instrumentos que contribuem positivamente na alfabetização de crianças.
Também critica a prática construtivista, tão difundida em escolas brasileiras, ao negligenciar aspectos cruciais do processo de alfabetização.
Membro da Comissão Científica do Plano Nacional de Leitura de  Portugal, José Morais integrou um grupo de sete especialistas que, em 2003, avaliou práticas e políticas no Brasil relacionadas à alfabetização.
"Impressionou-me a atitude de professores, altamente motivados, conscientes da sua missão e desejosos de mudança", destacou, complementando que o País precisa ajudar esses docentes.
José Morais estará em Jaboatão dos Guararapes, quarta-feira, para participar do seminário Alfabetização:
evidências científicas internacionais sobre o que melhor funciona,  promovido pelo Instituto Alfa e Beto (IAB), em parceria com a Secretaria de Educação de Jaboatão.
Por e-mail, ele concedeu entrevista à repórter Margarida Azevedo. JC
Existe uma idade certa para iniciar a alfabetização de uma criança?
Em que tempo ela deve estar alfabetizada?
Para o Ministério da Educação, no Brasil, a meta é que todas as crianças brasileiras saibam ler e escrever até os 8 anos de idade.
JOSÉ MORAIS -- Não, não existe.
Segundo os países, começa-se entre os 5 e os 7 anos.
Aos 5 anos, a criança está cognitivamente e emocionalmente preparada para aprender a ler, mas a sua alfabetização não fica comprometida se a sociedade decide que a alfabetização sistemática na escola começa mais tarde.
No entanto, é útil que a alfabetização sistemática seja precedida por uma preparação bem orientada de pelo menos um ano ou dois.
JC -- Alfabetização começa em casa?
Como os pais podem contribuir na alfabetização dos filhos?
JOSÉ MORAIS -- Pelo menos a preparação à alfabetização começa em casa.  Boa ou má, começa sempre.
O melhor serviço que os pais podem fazer aos filhos nesta matéria é terem muitos livros, revistas e jornais em casa, e lerem muito, eles mesmos.
Se substituírem uma hora de televisão
(por exemplo, na hora da telenovela, depois das notícias)
por leitura de livro e jornal, estarão contribuindo muito para a alfabetização dos filhos, e ainda mais se também conversarem com eles, falando-lhes eventualmente sobre o que estão lendo.
Além disso, há as leituras partilhadas, há as explicações a respeito das características dos textos e, conjuntamente, a chamada da atenção da criança, inclusive através de jogos, para as propriedades estruturais e formais da língua, em particular das propriedades fonológicas, mas também das morfológicas e sintáxicas.
 JC -- Qual a importância de basear as práticas de alfabetização em conhecimentos científicos?
JOSÉ MORAIS -- Aprender a ler e escrever é um longo processo, extremamente complexo que se passa na mente da criança e que é influenciado por muitos fatores, quer biológicos quer socioculturais, quer experienciais.
Hoje não sabemos tudo, nunca saberemos tudo, sobre os processos de aprendizagem em geral e sobre aqueles que são específicos à leitura e à escrita.
Mas, graças ao desenvolvimento da psicolinguística experimental e das ciências e neurociências cognitivas, já sabemos muito, e até começamos a identificar com uma grande precisão, as estruturas que são ativadas no cérebro, inclusive em que sequência temporal, quando a criança é confrontada com palavras ou um texto ou ainda quando recebe uma tarefa de escrita.
Esse conhecimento pode ser aproveitado para facilitar e orientar a aprendizagem, em particular elaborando aqueles programas escolares e métodos de ensino e desenvolvendo aquelas práticas pedagógicas que serão os ou as mais eficazes.
JC -- Observando a alfabetização, onde a teoria construtivista falha?
JOSÉ MORAIS -- Aquilo que é apresentado no mundo da educação brasileira como sendo a teoria construtivista só muito longinquamente se relaciona com o construtivismo em filosofia ou em psicologia cognitiva. Relativamente ao construtivismo a que se refere, há que distinguir entre o fracasso da teoria e o da prática.
Uma teoria não falha nem tem sucesso, é mais correto dizer que ela é corroborada pelos fatos ou que, ao contrário, é falsificada por eles.
A teoria construtivista em matéria de leitura e escrita não é aceita, e direi mesmo é descartada, pela comunidade científica.
JC - Por quê?
JOSÉ MORAIS - Primeiro, porque a evidência em que se baseia é muito magra e obtida em condições que não respeitam as exigências científicas atuais (por exemplo, recurso quase exclusivo a entrevistas e questionários que não são suscetíveis de pôr em evidência nenhum dos processos inconscientes que têm lugar no cérebro e na mente).
Em segundo lugar, porque toda a ciência atual da leitura e da escrita se desenvolveu e continua a desenvolver-se na base de hipóteses e de verificações empíricas às quais esse construtivismo é alheio.
Quanto à prática construtivista, essa sim, pode-se dizer que falhou.
A primeira razão está no fato de não ter fundamento científico, e a segunda, provavelmente, no fato de ter negligenciado aspectos cruciais do processo de alfabetização, como o papel das habilidades fonológicas, da decodificação e a importância destas no desenvolvimento dos processos automáticos de identificação das palavras escritas.
JC -- Como o senhor avalia a formação dos professores nas universidades, sobretudo no aspecto da formação para alfabetização?
JOSÉ MORAIS -- Não conheço de perto a formação dos professores nas universidades, mas, pelos contatos que tenho tido com muitos deles, infiro que a sua formação é claramente insuficiente, o que não é característica exclusivamente brasileira, pois mesmo em países desenvolvidos em que o resultado das crianças é muito melhor (é o caso da França) do que o das crianças brasileiras, a formação dos professores constitui um problema sério. O que me inquieta mais, na percepção que pude ter a partir desses contatos, é que não vejo desenvolver-se nenhuma iniciativa séria suscetível de melhorar a formação.
Como formar bem os professores, se os próprios formadores estão na sua grande maioria insuficientemente formados?
Para mudar radicalmente a situação, seria necessário que nas universidades aparecesse um número importante de professores e pesquisadores em psicolinguística experimental e em psicologia das aprendizagens, com uma formação científica sólida e atualizada.
Como conseguir isso não sei, mas gostaria que os mais altos responsáveis pelo ensino universitário e a pesquisa científica refletissem sobre esta questão e agissem nesse  sentido.
JC -- O senhor participou de um grupo de especialistas que avaliou a alfabetização no Brasil.
O que mais chamou a atenção na experiência brasileira (positivamente e negativamente)?
JOSÉ MORAIS -- O que mais me impressionou negativamente foi a falta de espírito científico e de conhecimento científico no mundo da educação brasileira.
Como este mundo corre atrás de ideias aparentemente sedutoras, sem refletir criticamente, e cria ídolos sem sequer conhecer bem o que fizeram ou escreveram!
É impressionante!
O que mais me impressionou positivamente é que também há neste País homens e mulheres inteligentes, competentes e corajosos que querem mudar a situação.
São muito poucos ainda e esbarram contra mentalidades imobilizadas e provavelmente interesses protegidos.
Mas também me impressionou muito favoravelmente a atitude de muitos professores e responsáveis locais que são altamente motivados, conscientes da sua missão e desejosos de mudança.
Têm de ser ajudados!
JC -- O que podemos aprender com as mudanças implementadas por países como a Inglaterra, França e Estados Unidos, que reviram suas práticas de alfabetização?
JOSÉ MORAIS -- Imenso!
Se os responsáveis pela política educacional e de alfabetização do Brasil quiserem saber o que foi a experiência do Observatório Nacional da Leitura na França e do atual Plano Nacional de Leitura de Portugal, de cuja comissão científica faço parte e para o qual orientei um estudo empírico sobre os níveis de referência na leitura e na escrita do 1° ao 6° ano de escolaridade, terei todo o gosto em informar-lhes e em pô-los em contato com os responsáveis por aqueles organismos, em particular a Secretaria de Estado para o ensino primário e secundário de Portugal que coordenou comigo o grupo de trabalho que efetuou aquele estudo.
JC -- Prática comum nas escolas brasileiras em décadas passadas, o ditado, a cópia de textos e o uso de cadernos de caligrafia praticamente não existem mais.
Qual sua opinião sobre esses instrumentos?
JOSÉ MORAIS -- Penso, de acordo com os estudos científicos realizados sobre essas questões, que o ditado é importantíssimo para a consolidação das representações ortográficas das palavras e a avaliação deste conhecimento, e que o treino da caligrafia e de modo mais geral da escrita cursiva é importante para um desenvolvimento completo das habilidades de escrita. Há estudos que mostram, por exemplo, que desenhar manualmente as letras no início da alfabetização tem uma influência considerável no próprio reconhecimento e discriminação das letras.
Quanto à cópia, creio, não por evidência direta, mas por extrapolação a partir de outros estudos, que a cópia de palavras que foram trabalhadas para aquisição de vocabulário e da sua forma ortográfica é mais pertinente que a cópia de texto.
JC -- Embora tenha melhorado o desempenho nas duas últimas edições do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), realizado a cada três anos, pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil ainda está com resultado ruim.
Em 2009, ficou em 53º lugar de um total de 65 países, no ranking de leitura e ciências.
Outras pesquisas evidenciam que o brasileiro lê muito pouco.
Leitura faz diferença no processo de alfabetização?
JOSÉ MORAIS -- É indispensável.
Toda a aquisição, consolidação e manutenção de habilidade exige uma prática constante.
Isso também acontece, portanto, com as habilidades de leitura e escrita.
Sem uma prática intensiva da leitura na escola e fora da escola, nenhuma criança se torna boa leitora.
E o mesmo acontece com a escrita, que é mais exigente cognitivamente do que a leitura.
JC -- O Brasil tem 9,7% da população com mais de 15 anos analfabeta.
O maior problema é no Nordeste, região onde fica Pernambuco, Estado natal do educador Paulo Freire.
O senhor conhece o método freyriano?
Se sim, considera que ainda poderia ser aplicado para reduzir o analfabetismo em pessoas adultas?
JOSÉ MORAIS -- Conheço sim, em particular por ter estado na banca de uma tese de doutorado que analisou a experiência de Angicos e o pensamento de Paulo Freire e que incluía entrevistas com ele e com algumas das pessoas que tinham sido alfabetizadas.
O método de Freire era claramente silábico, e ele não pretendia ter desenvolvido um método original de alfabetização.
O método silábico pode obviamente ser aplicado, serviu e tem servido para alfabetizar não só adultos, mas também muitas crianças, mas tendo em conta o que sabemos hoje sobre a aprendizagem da leitura não me parece ser o mais eficaz para assegurar a compreensão do princípio em que repousa a escrita alfabética e o domínio rápido do mecanismo de decodificação.


Olá professor!
Considero este assunto muito importante, pois vivemos um período muito ambiguo em relação as teorias pedagógicas.
Até onde posso perceber, o mais importante é que o construtivismo nunca foi um método de alfabetização.
Levar os alunos a praticarem mais a leitura e escrita não precisa necessariamente ser em temíveis ditados de palavras soltas e sem significado ou cópias de textos de outros.
Durante 5 anos trabalhei numa escola construtivista e posso afirmar que se esta filosofia (gosto de usar este termo para a teoria) quando bem aplicada, não elimina as práticas por ele citadas, apenas altera o seu formato e objetivo imediato.
Ao invés de copiar os textos dos livros que geralmente fazem parte de um universo totalmente diferente do vivido pelas crianças, procura-se elaborar textos próprios.
Partindo desta própria criação, introduz-se um trabalho de pesquisa sobre o assunto
(que pode ser uma visita a um museu, galeria, um filme ou uma peça teatral) e assim introduzíamos novo vocabulário, lançávamos mão da prática da escrita como mecanismo propriamente dito.
Nossos alunos não temiam ir ao quadro escrever qualquer coisa, não temiam o erro, pois correção não era sinônimo de fracasso porque ela era feita naturalmente, entre eles próprios pela constatação.
O tão discriminado dicionário era o melhor amigo das crianças em sala. Montávamos um enorme glossário ilustrado por eles mesmos - o último que montamos continha 1285 palavras e foi elaborado por 35 alunos das turmas de 3º período (ed. Infantil sim!) e 1º ano.
Todas tinham entre 5 e 7 anos.
Alguém pode pensar: mas isso é escola de classe média!
A maioria delas tinha um padrão social mediano, mas não acredito na teoria de que escola de pobre deva ser diferente.
Quando a escola fechou, a grande maioria foi para a rede municipal.
Não era o perfil de alunos exclusivo de escola particular.
Todo este relato de uma prática (um tanto longo, perdoe-me) é para refletirmos sobre o que é certo e o que é errado.
Até onde a ciência pode determinar o que é boa prática dentro de uma sala de aula?
A teoria freiriana (de onde tiraram aquele Y? é pra ficar mais científica?
he he he) baseia-se unicamente em algo que não existe explicação científica:
no acolhimento, na aceitação do saber e vivência do outro como ponto de partida para ampliação de seus horizontes.
Acolher alguém significa dar-lhe crédito, escutar-lhe, perceber a importância de sua contemporaneidade.
Para quem acredita que a ciência resolve tudo, suas receitas são infalíveis, sugiro a leitura sobre o trabalho de R. Spitz, psiquiatra austríaco que no início do século XX pesquisou a importância do afeto na recuperação e desenvolvimento infantil.
Segundo ele, crianças sem afeto e aceitação não se desenvolvem plenamente, nem física nem emocionalmente.
Paulo Freire só vem confirmar isso.
Finalmente, podemos concordar sobre a formação dos profissionais sim, pois muita gente por aí utiliza uma salada inútil de atividades supostamente construtivistas, elimina práticas supostamente consideradas arcaicas e não chega a lugar algum.
Nesse caso, prefiro a velha cartilha... o estrago é menor!
Abraços e obrigada por trazer a tona um assunto tão importante e atual.

Um comentário:

  1. Tambem eu reconheço a validade do didtado, da leitura, da fala, da letra cursiva.
    concordo tambem que o método freiriano seja silábico, historicamente politico, e iniciou a preocupaçao com a contextualizaçao e o valor significativo para o aluno.
    a questão colocada pela Professora Jenny Horta, tambem é totalmente valida.
    Jean Piaget nunca se disse em primeiro lugar um pedagogo.
    O valor da sua teoria construtivista é quase inquestionavel.
    Saber o que se pretende e conhecer o momento e dosagens certas de utilisar determinadas açoes é que é fundamental.

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