QUARTA-FEIRA, 11 DE JULHO DE 2012
Sanguessugado do Cultura, Esporte e Política
Telegramas revelam intenções de
veto e ações dos EUA contra o desenvolvimento tecnológico brasileiro com
interesses de diversos agentes que ocupam ou ocuparam o poder em ambos os
países
Os telegramas da diplomacia dos
EUA revelados pelo Wikileaks revelaram que a Casa Branca toma ações concretas
para impedir, dificultar e sabotar o desenvolvimento tecnológico brasileiro em
duas áreas estratégicas: energia nuclear e tecnologia espacial. Em ambos os
casos, observa-se o papel anti-nacional da grande mídia brasileira, bem como
escancara-se, também sem surpresa, a função desempenhada pelo ex-presidenteFernando
Henrique Cardoso, colhido em uma exuberante sintonia com os interesses
estratégicos do Departamento de Estado dos EUA, ao tempo em que exibe
problemática posição em relação à independência tecnológica brasileira. Segue o
artigo do jornalista Beto Almeida.
O primeiro dos telegramas
divulgados, datado de 2009, conta que o governo dos EUA pressionou autoridades
ucranianas para emperrar o desenvolvimento do projeto conjunto Brasil-Ucrânia
de implantação da plataforma de lançamento dos foguetes Cyclone-4 – de
fabricação ucraniana – no Centro de Lançamentos de Alcântara , no Maranhão.
Veto imperial
O telegrama do diplomata
americano no Brasil, Clifford Sobel, enviado aos EUA em fevereiro daquele ano,
relata que os representantes ucranianos, através de sua embaixada no Brasil,
fizeram gestões para que o governo americano revisse a posição de boicote ao
uso de Alcântara para o lançamento de qualquer satélite fabricado nos EUA. A
resposta americana foi clara. A missão em Brasília deveria comunicar ao
embaixador ucraniano, Volodymyr Lakomov, que os EUA “não quer” nenhuma
transferência de tecnologia espacial para o Brasil.
“Queremos lembrar às autoridades
ucranianas que os EUA não se opõem ao estabelecimento de uma plataforma de
lançamentos em Alcântara, contanto que tal atividade não resulte na
transferência de tecnologias de foguetes ao Brasil”, diz um trecho do
telegrama.
Em outra parte do documento, o
representante americano é ainda mais explícito com Lokomov: “Embora os EUA
estejam preparados para apoiar o projeto conjunto ucraniano-brasileiro, uma vez
que o TSA (acordo de salvaguardas Brasil-EUA) entre em vigor, não apoiamos o
programa nativo dos veículos de lançamento espacial do Brasil”.
Guinada na política externa
O Acordo de Salvaguardas
Brasil-EUA (TSA) foi firmado em 2000 por Fernando Henrique Cardoso, mas foi
rejeitado pelo Senado Brasileiro após a chegada de Lula ao Planalto e a guinada
registrada na política externa brasileira, a mesma que muito contribuiu para
enterrar a ALCA. Na sua rejeição o parlamento brasileiro considerou que seus
termos constituíam uma “afronta à Soberania Nacional”. Pelo documento, o Brasil
cederia áreas de Alcântara para uso exclusivo dos EUA sem permitir nenhum
acesso de brasileiros. Além da ocupação da área e da proibição de qualquer
engenheiro ou técnico brasileiro nas áreas de lançamento, o tratado previa
inspeções americanas à base sem aviso prévio.
Os telegramas diplomáticos
divulgados pelo Wikileaks falam do veto norte-americano ao desenvolvimento de
tecnologia brasileira para foguetes, bem como indicam a cândida esperança
mantida ainda pela Casa Branca, de que o TSA seja, finalmente, implementado
como pretendia o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Mas, não apenas a
Casa Branca e o antigo mandatário esforçaram-se pela grave limitação do
Programa Espacial Brasileiro, pois neste esforço algumas ONGs, normalmente
financiadas por programas internacionais dirigidos por mentalidade
colonizadora, atuaram para travar o indispensável salto tecnológico brasileiro
para entrar no seleto e fechadíssimo clube dos países com capacidade para a
exploração econômica do espaço sideral e para o lançamento de satélites.
Junte-se a eles, a mídia nacional
que não destacou a gravíssima confissão de sabotagem norte-americana contra o
Brasil, provavelmente porque tal atitude contraria sua linha editorial
historicamente refratária aos esforços nacionais para a conquista de
independência tecnológica, em qualquer área que seja. Especialmente naquelas em
que mais desagradam as metrópoles.
Bomba! Bomba!
O outro telegrama da diplomacia
norte-americana divulgado pelo Wikileaks e que também revela intenções de veto
e ações contra o desenvolvimento tecnológico brasileiro veio a tona de forma
torta pela Revista Veja, e fala da preocupação gringa sobre o trabalho de um
físico brasileiro, o cearense Dalton Girão Barroso, do Instituto Militar de
Engenharia, do Exército. Giráo publicou um livro com simulações por ele mesmo
desenvolvidas, que teriam decifrado os mecanismos da mais potente bomba nuclear
dos EUA, a W87, cuja tecnologia é guardada a 7 chaves.
A primeira suspeita revelada nos
telegramas diplomáticos era de espionagem. E também, face à precisão dos
cálculos de Girão, de que haveria no Brasil um programa nuclear secreto,
contrariando, segundo a ótica dos EUA, endossada pela revista, o Tratado de Não
Proliferação de Armas Nucleares, firmado pelo Brasil em 1998, Tal como o Acordo
de Salvaguardas Brasil-EUA, sobre o uso da Base de Alcântara, o TNP foi firmado
por Fernando Henrique. Baseado apenas em uma imperial desconfiança de que as
fórmulas usadas pelo cientista brasileiro poderiam ser utilizadas por
terroristas , os EUA, pressionaram a Agência Internacional de Energia Atômica
(AIEA) que exigiu explicações do governo Brasil , chegando mesmo a propor o
recolhimento-censura do livro “A física dos explosivos nucleares”. Exigência
considerada pelas autoridades militares brasileiras como “intromissão indevida
da AIEA em atividades acadêmicas de uma instituição subordinada ao Exército
Brasileiro”.
Como é conhecido, o Ministro da
Defesa, Nelson Jobim, vocalizando posição do setor militar contrária a
ingerências indevidas, opõe-se a assinatura do protocolo adicional do Tratado
de Não Proliferação de Armas Nucleares, que daria à AIEA, controlada pelas
potências nucleares, o direito de acesso irrestrito às instalações nucleares
brasileiras. Acesso que não permitem às suas próprias instalações, mesmo sendo
claro o descumprimento, há anos, de uma meta central do TNP, que não determina
apenas a não proliferação, mas também o desarmamento nuclear dos países que
estão armados, o que não está ocorrendo.
Desarmamento unilateral
A revista publica providencial
declaração do físico José Goldemberg, obviamente, em sustentação à sua linha
editorial de desarmamento unilateral e de renúncia ao desenvolvimento
tecnológico nuclear soberano, tal como vem sendo alcançado por outros países,
entre eles Israel, jamais alvo de sanções por parte da AIEA ou da ONU, como se
faz contra o Irã. Segundo Goldemberg, que já foi secretário de ciência e
tecnologia, é quase impossível que o Brasil não tenha em andamento algum
projeto que poderia ser facilmente direcionado para a produção de uma bomba
atômica. Tudo o que os EUA querem ouvir para reforçar a linha de vetos e
constrangimentos tecnológicos ao Brasil, como mostram os telegramas divulgados
pelo Wikileaks. Por outro lado, tudo o que os EUA querem esconder do mundo é a
proposta que Mahmud Ajmadinejad , presidente do Irà, apresentou à Assembléia
Geral da ONU, para que fosse levada a debate e implementação: “Energia nuclear
para todos, armas nucleares para ninguém”. Até agora, rigorosamente sonegada à
opinião pública mundial.
Intervencionismo crescente
O semanário também publica franca
e reveladora declaração do ex-presidente Cardoso : “Não havendo inimigos
externos nuclearizados, nem o Brasil pretendendo assumir uma política regional
belicosa, para que a bomba?” Com o tesouro energético que possui no fundo do
mar, ou na biodiversidade, com os minerais estratégicos abundantes que possui
no subsolo e diante do crescimento dos orçamentos bélicos das grandes
potências, seguido do intervencionismo imperial em várias partes do mundo,
desconhecendo leis ou fronteiras, a declaração do ex-presidente é, digamos, de
um candura formidável.
São conhecidas as sintonias entre
a política externa da década anterior e a linha editorial da grande mídia em
sustentação às diretrizes emanadas pela Casa Branca. Por isso esses pólos
midiáticos do unilateralismo em processo de desencanto e crise se encontram tão
embaraçados diante da nova política externa brasileira que adquire, a cada dia,
forte dose de justeza e razoabilidade quanto mais telegramas da diplomacia
imperial como os acima mencionados são divulgados pelo Wikileaks.
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